sábado, 7 de abril de 2012

juran que esa paloma no es otra cosa más que su alma.

Ela teima em dizer que não, mas eram de amêndoas os biscoitos que ela trouxe para o quarto na primeira manhã. O chá, concordamos, era de erva-doce, e bebi feliz, embora não suporte nem o cheiro de erva-doce. Chegou esvoaçante, as maçãs ainda coradas do calor do forno, sorrindo com as duas arcadas à mostra, num harmonioso quase excesso de dentes, que só combina com seu rosto longo. A blusa era minha, não achei a minha nessa bagunça, espero que não se importe, mas a calça cor de chiclete era absolutamente dela. Enquanto eu provava os biscoitos ela me olhava com uma expressão que até hoje não compreendo. Eu tentava fazer parecer que aquilo tudo não era tão importante assim, mas ela pouco se importou. Sorria e sorria e virava a cabeça de lado, de jeito que os cabelos muito compridos esbarrassem nos joelhos cruzados à minha frente. São todos pra mim?, quis saber em mais uma tentativa de me sentir no controle. Ela fez que sim com a mesma cabeça de lado, o mesmo sorriso largo e me venceu de novo, sem nem saber que estava lutando, o que para mim era ainda mais desconcertante. 

Levantou-se num rompante e começou a arrumar o quarto e a falar sobre o que iríamos fazer durante o dia. Iria me levar para conhecer a cidade, tomaríamos o melhor capuccino que ela já havia provado na vida, iríamos à feira comprar uma lista de coisas (que não entendia como ela tinha memorizado de tantas que eram) para preparar o jantar em casa e por fim encontraríamos alguns amigos dela que queria que eu conhecesse, os mesmos que se juntariam a nós à noite para provar o prato cujo nome até hoje não consegui memorizar. Falava e gesticulava, às vezes se sentava na beira da cama e tocava meus pés por alguns segundos, e logo se levantava novamente, como se estivesse um pouco tímida apesar de eufórica de novidades.

Foi até a sacada e acenou para uma senhora que morava na janela do mesmo andar do outro lado da rua. Disse palavras que não consegui entender, sorriu e enrolou os cabelos num nó que se desfez automaticamente, e os fios derreteram dançantes até a cintura. Pegou a bandeja em cima da cama, deu alguns passos em círculos, todo o tempo falando sem parar e eu, em silêncio, mais por não querer interrompê-la do que me parecia um êxtase ansioso, do que por não ter o que dizer. Falava de umas gravuras, algo em que havia trabalhado nas últimas semanas e queria me mostrar, mas não tinha mãos para pegar, Vou deixar isso na cozinha, me espera que já volto, e eu me perguntei para onde e como ela achava que eu iria fugir.

Voltou com uma garrafa de água gelada, Nessa época faz tanto calor que não sei, e também fiquei eu sem saber o que queria dizer. Acredito que tenha se esquecido dos tais desenhos, porque se deitou na cama de lado me dizendo Você prometeu que ia pentear meu cabelo e foi a única coisa que precisou me pedir desde então, quando me enfeitiçou o cheiro de flores que se espalhou pelo quarto naquela manhã.

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