segunda-feira, 8 de novembro de 2010

arrastando o sari.

Dalva nasceu numa quinta-feira de lua cheia de parto normal, o que poucos acreditaram, pois nunca se viu bebê mais robusto na família. O pai faleceu cedo, deixando a mulher e as duas filhas no casarão em Niterói.

Dalva tornou-se Dalvinha, desde sempre uma baixinha nervosa de pestanas longas que tremilicavam sempre que ela se enfezava com alguma coisa. A irmã Elsi, uma sapatão inveterada, fazia broma do jeito sonhador de Dalvinha, mas ela não desistia da idéia de se casar. 

- Não quero qualquer um. Só me caso com um príncipe, mas um príncipe de verdade, um príncipe fidalgo!
Um dia, quando saía da Imprensa, Dalvinha puxou a amiga pelo braço:

- Tem um baile hoje no Consulado, é minha chance de encontrar o meu príncipe.

A amiga não teve outra opção a não ser acompanhar Dalvinha, que, de tão agitada com a possibilidade de finalmente desposar, ensopava as mangas do vestido de suor. A bem da verdade, ela não fazia a mais vaga idéia do que era um Consulado. Só lhe atravessava mesmo o pensamento de encontrar algum homem vindo de um país mirabolante.

E assim foi. Dalvinha com a amiga a tiracolo, logo começou de trelelê com um hindu, diga-se de passagem, bem mais moço do que ela, pele de um marrom seco, roupas e turbante coloridos e a barba arrastando no peito.

- Veja só, isso sim é um príncipe fidalgo!
A amiga nem se atrevia a opinar. O homem pouco entendia o que ela dizia, mas o suficiente para aceitar o convite para a última sessão exibida no Odeon. E foram. Dalvinha, o hindu e a amiga, que se perguntava a todo minuto onde havia amarrado seu burro.

Chegaram esbaforidos, quase atrasados e só tiveram mesmo tempo para se sentarem, quando as luzes logo se apagaram. Assim que o telão se iluminou, teve início uma chuva de vaias e reclamações, e Dalvinha, roxa de vergonha, só pensava:

- Bando de sem educação. O que o príncipe vai pensar?

De repente, foi possível distinguir entre os "uuuuus" ininterruptos um sonoro:

- Tira o chapéu!!!

Dalvinha, mais roxa do que antes, não sabia onde enfiava a cara, muito menos como ia falar para o príncipe que seu turbante era o motivo de tamanha insatisfação. A amiga, coitada, só tentava se lembrar de porque tinha afinal caído naquela cilada.

É evidente que o episódio não teve futuro e Dalvinha ficou traumatizada a ponto de nunca mais pisar na sala de exibição, mas não o suficiente para desistir de se tornar a mulher de um fidalgo.

Muitos anos depois, a amiga cruzou com Elsi durante as compras de Natal. Sobre Dalvinha, a única notícia esperada para uma solteirona imaculada:

- Morreu do coração a pobre.

Um comentário:

Antonio de Castro disse...

coitada de dalvinha.

e eu ainda tinha esperanças que os solteirões ficassem ricos.